segunda-feira, 3 de dezembro de 2018





DEFESA SOCIAL EM PERSPECTIVA:
POR UMA NOVA SEGURANÇA PÚBLICA
Claudionor Rocha[1]

                    O Centro de Estudos e Debates Estratégicos (Cedes) órgão vinculado à Mesa da Câmara dos Deputados, elaborou estudo sobre segurança pública, o qual gerou dois volumes. Um foi produzido pelo Deputado Paulo Teixeira, com assessoramento de especialistas e acadêmicos de renome, intitulado “Agenda de segurança cidadã: por um novo paradigma”. O outro trabalho, que agrega substancial contribuição também de vários profissionais, especialistas e estudiosos do tema que participaram dos oito eventos promovidos durante a realização do estudo, e agrega contribuição dos consultores legislativos que assessoraram o Cedes, está sendo lançado pelo Deputado Capitão Augusto, com o título “Segurança pública: prioridade nacional”.
                    Como uma das possibilidades resultantes do estudo, conduzido de 2015 a 2018, foi por nós produzida uma minuta de Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que procura condensar as modificações essenciais sugeridas, utilizando, como subsídios, o aporte de reflexões havidas durante o estudo, além de alterações inspiradas por outras proposições em tramitação ou já arquivadas.
                 A PEC, em síntese, propõe a flexibilização do ‘sistema’, criando um conselho e propondo solução para o financiamento das atividades de segurança pública. O texto é deliberadamente extenso e abrangente a fim de permitir aprimoramento, mediante análise da pertinência dos temas e extensão desejada de detalhamento. As alterações são muitas e a justificativa, para não ser demasiado extensa, propõe-se acompanhar de nota técnica que constitui a primeira parte do presente estudo. Muitos dispositivos seriam mais adequados a compor a lei complementar prevista como regulamentadora da PEC.
                    Para elaboração da PEC partiu-se da assunção das seguintes premissas, cujos problemas subjacentes necessitam ser resolvidos:
                    1) Há certa insuficiência ou inadequação do capítulo constitucional sobre segurança pública.
                    2) Inexiste identidade policial autorreferente nas polícias estaduais, o que leva ao chamado espelhamento ou isomorfismo mimético, isto é, as polícias civis buscam se assemelhar aos órgãos do Poder Judiciário, enquanto as polícias militares e corpos de bombeiros militares procuram similaridade com as Forças Armadas, em especial com o Exército Brasileiro.
                    3) Há um desgaste do modelo policial reativo (versus o proativo, considerado mais adequado), causando os seguintes fenômenos, sucessivamente: a intensidade dos crimes leva os órgãos de policiamento ostensivo à ‘repressão imediata’ em vez de ‘prevenção’; essa injunção origina certa demanda reprimida nos órgãos da polícia civil; em consequência há baixas qualidade e resolutividade na apuração das infrações penais; mesmo assim, a demanda reprimida prossegue no âmbito do Ministério Público e do Poder Judiciário; demais disso, alguns órgãos do parquet optam por ‘investigar’, gerando outras distorções, como seletividade dos casos investigados, falta de controle externo dessa atividade bissexta e falta de quadros treinados para a tarefa.
                    4) Ocorrem limitações de gestão e integração, haja vista existir uma histórica disputa por poder e visibilidade entre vários órgãos componentes do sistema de justiça criminal, a saber: polícia civil versus polícia militar[2], especialmente entre delegados de polícia e oficiais; polícia civil versus Ministério Público, especialmente no tocante ao pretenso monopólio da investigação pelos delegados e o controle externo exercido pelos promotores de forma, muitas vezes, seletiva e ineficaz, além de ilegal – já que não há uma lei, mas resolução do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), regulando a matéria. Existe, ainda, simpatias recíprocas entre polícia militar e Ministério Público, em defesa da extinção do inquérito policial e da redução do protagonismo e até da categoria dos delegados; e entre policiais federais e Ministério Público, em defesa da carreira única para todos os policiais. Demais disso, no âmbito das próprias corporações, há um natural conflito de interesses entre categorias dirigentes e subordinadas, isto é, delegados versus agentes, na polícia civil; oficiais versus praças, nos órgãos militares. Essa realidade estimula animosidade, baixa efetividade e alta taxa de atrito[3].                                                                                
                    5) Há uma escalada do crime e da violência, não obstante os investimentos aplicados em segurança pública ao longo das últimas décadas.
                    6) Falta protagonismo da União e maior responsabilidade dos Municípios, a ser constitucionalmente prevista, no âmbito da provisão de segurança pública.
                    7) Na prática, estão ausentes do subsistema de segurança pública os demais órgãos integrantes do sistema de justiça criminal (Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública).
                    8) Há forte resistência das polícias militares à ampliação de participação dos Municípios na manutenção da ordem pública, por meio das guardas ou polícias municipais, bem como dos corpos de bombeiros militares à existência dos bombeiros municipais e voluntários.
                    9) Há um entendimento equivocado e fragmentário em relação às propostas de unificação das polícias, ou a extensão do ciclo completo às polícias ostensivas, com forte resistência das polícias militares e das polícias civis, respectivamente, a tais reestruturações dos órgãos ou atividades.
                    10) Prevalece, no âmbito das administrações estaduais, o pacto federativo exculpante (fundado no art. 18 da Constituição) versus a busca de uma solidariedade federativa (prevista no art. 241 da Carta).
                    Reveladas as premissas, foram estabelecidos os seguintes eixos estruturantes para a elaboração da PEC:
                    a) Constitucionalização de preceitos, com texto essencial a ser integrado no corpo da Constituição e texto instrumental integrando dispositivos autônomos da Emenda.
                    b) Regulamentação da PEC por lei complementar, em razão de essa espécie normativa exigir processo legislativo mais rígido e, além disso, não poder ser iniciada por medida provisória (MP). Tal critério impede que o Presidente da República opte pela via da urgência, na qual o tempo para reflexão e maturação dos temas é escasso, inibindo a apreciação da matéria nas Comissões temáticas, uma vez que as MP são apreciadas apenas em Plenário. Afora isso, em razão do prazo reduzido, a discussão em geral é tumultuária e com resultados nem sempre satisfatórios[4].
                    c) Previsão de estreita cooperação entre órgãos públicos de segurança e de defesa civil num só sistema de ‘defesa social’.
                    d) Instituição de um ‘sistema nacional de defesa social’, de adesão voluntária dos Estados, Distrito Federal e Municípios.
                    e) Flexibilização do modelo policial, facultando a unificação dos órgãos existentes ou criação de outros. Entretanto, no âmbito estadual e do Distrito Federal se estimula a fusão.
                    f) Desmilitarização das polícias militares e corpos de bombeiros militares condicionada à extinção do vínculo com o Exército, com o que deixariam de ser consideradas forças auxiliares e reserva do Exército. Com essa providência se alargaria o conceito de mobilização para todas as polícias.
                    g) Faculdade de criação controlada de polícias municipais e metropolitanas.
                    h) Financiamento solidário do subsistema de segurança pública por meio de um fundo constitucionalmente previsto, com a exigência de aplicação mínima definida e a liberação de recursos condicionada ao atingimento de metas pelos entes aderentes.
                    i) Criação de um conselho constitucional de defesa social, nos moldes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do aludido CNMP.
                    j) Manutenção dos direitos adquiridos dos profissionais de segurança pública, inclusive previdenciários, exceto o direito de greve.
                    k) Previsão de crimes de responsabilidade no âmbito do sistema, a ser definido na lei complementar regulamentadora.              
                    l) Difusão da filosofia de policiamento do tipo proativo, comunitário, com foco no cidadão e orientado para a resolução de conflitos e solução de problemas.
                    Contextualizando a unicidade da proposta, esclareça-se que seriam apresentadas outras minutas de proposições, posteriormente – as quais pretendemos, igualmente, elaborar – cujo início no processo legislativo dependeria, em tese, da aprovação da PEC sugerida.
                    Observamos que em relação à minuta ora apresentada, sua redação estaria obviamente sujeita a aperfeiçoamento, tanto no aspecto estrutural, quanto da eventual adequação terminológica.
                    Comentaremos, a seguir, os dispositivos da minuta da PEC, sequencialmente e, por fim, ligeira conclusão. Ao final, exibimos em anexo o texto completo da minuta da PEC e respectiva justificativa.

terça-feira, 20 de novembro de 2018






REFORMA POLÍTICA NO BRASIL: O DILEMA DA PROPORCIONALIDADE
Claudionor Rocha[1]
Introdução
O sistema político-eleitoral brasileiro é tido como uma das causas da difícil governabilidade e outros problemas conexos, como a corrupção e a impunidade vinculadas ao exercício de mandatos eletivos.
Vez por outra a reforma política é lançada como panaceia para a resolução de tais problemas. Entretanto, não obstante as tentativas recentes, uma reforma em nível amplo não se conseguiu lograr, talvez devido à complexidade do tema, talvez por consistir em ideia lançada à guisa de remédio a solucionar todos os males.
O presente trabalho analisa a situação atual, as tendências surgidas no meio político e as discussões havidas na sociedade civil a respeito do tema, concluindo, afinal, que qualquer que seja o modelo de reforma político-eleitoral, o primeiro problema a ser resolvido é a questão da desproporcionalidade.
Qual reforma política?
Quando se discute reforma política vem à mente o sistema político, como gênero e os subsistemas partidário e eleitoral, que integram aquele, como espécie. As sugestões mais polêmicas em geral abordam alterações no sistema eleitoral[2].
As bases fundamentais do sistema político como um todo estão assentadas no regime democrático conquistado, além da forma de governo republicana e do sistema presidencialista, perenizados com o plebiscito de 1993, que confirmou o disposto na Constituição de 1988.
Quanto ao sistema partidário, suas bases estão igualmente instituídas constitucionalmente e, embora seja tido como frágil, parece haver-se adaptado ao sistema eleitoral. Entretanto, subsistem críticas de que os partidos brasileiros, se bem que coesos na arena parlamentar, não são muito disciplinados e chegam a ser até pouco relevantes na arena eleitoral.
Para apreender o sistema eleitoral, é preciso lembrar que o Brasil é um Estado federativo, sendo o Poder Legislativo bicameral no âmbito federal (Congresso Nacional), composto pela câmara alta, Senado Federal, que representa paritariamente as unidades federadas, com três senadores cada; e pela câmara baixa, a Câmara dos Deputados, que representa proporcionalmente as populações das unidades federadas, com oito a setenta deputados num total de 513. É unicameral nos entes federativos subnacionais de primeiro nível – Estados e Distrito Federal – e nos de segundo nível, os Municípios.
A eleição para os cargos do Poder Executivo e para o Senado Federal é majoritária, enquanto para a Câmara dos Deputados e os órgãos do Poder Legislativo dos 26 Estados (Assembleias Legislativas), do Distrito Federal (Câmara Legislativa) e dos 5.570 Municípios (Câmara de Vereadores) é proporcional.
Os mandatos são de quatro anos – salvo para o Senado, de oito – e coincidentes, exceto no nível municipal em que tanto os prefeitos, chefes do Poder Executivo, quanto vereadores, são eleitos dois anos depois dos demais cargos eletivos. Assim, a cada dois anos há eleições, nos anos pares.
O número de deputados estaduais – distritais, no Distrito Federal – está atrelado ao de federais do ente considerado, em número maior e relativamente proporcional, enquanto o dos vereadores é progressivo segundo a população, tudo conforme regras constitucionais (arts. 27, 29, 32, 45 e 46).
Não há sistema eleitoral perfeito, mas sistemas diferentes. O caso brasileiro é sui generis, pois combina sistema presidencialista com voto proporcional de lista aberta. Disso decorre o favorecimento ao multipartidarismo, que requer arranjos entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo, visando a garantir a governabilidade, o que se logra obter mediante o chamado presidencialismo de coalizão[3], em que o Presidente plebiscitário aloca recursos políticos e financeiros para formar sua base majoritária no Congresso Nacional.
Os sistemas eleitorais são concebidos, portanto, visando a dois objetivos principais: assegurar a governabilidade e garantir a representatividade. Para se atingir o primeiro desiderato a escolha recai no sistema majoritário ou pluralista, enquanto o ideal para a consecução do segundo é o sistema proporcional.
Assim, dentre os sistemas existentes o mais aclamado é o adotado na Alemanha, proporcional-majoritário e popularmente chamado ‘distrital-misto’, o qual combina características dos dois sistemas.
Desta forma se obtém elevado grau de proporcionalidade, isto é, representatividade, bem como se reduz os partidos efetivos para três principais, o que favorece a obtenção, pelo Poder Executivo, da necessária maioria no Congresso para implantar as políticas públicas necessárias.
Esse é o sistema preferido pela maioria dos brasileiros que discutem o tema, mas sua adoção, além de improvável, supostamente não traria soluções imediatas para os problemas para os quais ele é tido como panaceia. Isso porque outras alterações são igualmente importantes. Assim, além das discussões acerca do ‘perigo’ da adoção do sistema majoritário, popularmente chamado de ‘distrital puro’, há o problema conexo da forma de financiamento das campanhas eleitorais[4].
Então já se propôs a adoção do ‘distritão’, que seria a adoção do voto majoritário considerando o ente federado como um único distrito plurinominal, isto é, seriam eleitos os candidatos mais votados, simplesmente. Esse formato, porém, não traz proporcionalidade, visto que alija as minorias da alocação das vagas.
Qualquer forma de sistema majoritário induz, ainda, à especulação acerca do gerrymandering[5] que passaria a ocorrer, em prejuízo da chamada ‘justiça eleitoral’.
A discussão acerca do financiamento de campanha oscila entre o financiamento exclusivamente privado e o exclusivamente público, sendo que a forma mista atual também não agrada[6]. O financiamento exclusivamente privado praticamente excluiria os candidatos sem acesso ao poder econômico, elitizando a competição[7]. O exclusivamente público não resolveria o problema do ‘caixa dois’ e da corrupção que engendra[8]. O financiamento privado limitado poderia impor quantias máximas a serem doadas por pessoas jurídicas, podendo associá-la a doações de pessoas físicas, também limitadas, a exemplo do sistema utilizado nos Estados Unidos da América. No entanto, esse modelo não excluiria o caixa dois quanto às pessoas jurídicas, assim como favoreceria os partidos tidos como de esquerda no espectro ideológico, haja vista seus militantes contribuírem historicamente com uma espécie de ‘dízimo’ para o partido.
O maior problema, contudo, parece estar associado ao hermetismo induzido pelas regras constitucionais e infralegais que dispuseram acerca do número de representantes por ente federado. Por mandamento constitucional, na Câmara dos Deputados devem estar representados os habitantes dos Estados e do Distrito Federal, de forma proporcional às respectivas populações (art. 14). A Lei Complementar nº 78, de 30 de dezembro de 1993 inovou ao prever que a bancada total não pode ser aumentada, complementando o absurdo disposto no § 2º do art. 4º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que assegurou sua irredutibilidade[9].
O que incrementa a desproporcionalidade existente no sistema de lista aberta de voto transferível uninominal adotado no Brasil é a possibilidade de coligação partidária em que apenas a votação individual é que conta no resultado dos partidos coligados, além da adoção do cálculo de alocação das vagas não distribuídas pelo quociente eleitoral conforme as maiores médias e não as maiores sobras dos votos[10].
A solução para propiciar efetiva proporcionalidade entre votos e vagas obtidas pelos partidos deveria considerar o crescimento relativo das populações dos Estados, o que implicaria alteração constitucional e legal a respeito. Ademais, para dar tratamento equânime a um sistema assimétrico de difícil reajustamento, seria preciso não haver a limitação do mínimo de oito e do máximo de setenta representantes por unidade federada[11].
Na discussão acerca de qual é o sistema ideal, contudo, algumas questões devem ser postas. O foco do que é mais importante, segundo Nicolau (2003, p. 202), varia entre: 1) reduzir o número de partidos, criando condição de governabilidade, ou deixá-los livres, para adequada representação das minorias; 2) corrigir as distorções de proporcionalidade; 3) aumentar o controle do partido ou do eleitor sobre quais candidatos serão eleitos; ou, ainda, 4) ampliar a vinculação do representante com uma área geográfica.
A desproporcionalidade existente atualmente derivou da transformação, em Estados, dos ex-Territórios do Amapá e Roraima e da criação do Estado do Tocantins durante a Assembléia Nacional Constituinte de 1987/1988. Na ocasião aumentou-se de sessenta para setenta o máximo de deputados por unidade federada e estabeleceu-se o mínimo de oito. Havendo um incremento de quatro deputados a mais de cada ex-Território e oito de Tocantins, perfez-se na ocasião o total atual de 503 deputados federais.
A mencionada LC nº 78/1993 estipulou que "o número de deputados federais não ultrapassará quinhentos e treze representantes", com base em dados populacionais do ano anterior às eleições. Ajustando o disposto na Constituição, contemplou mais dez deputados pelo Estado de São Paulo, regra adotada já no pleito seguinte (1994).
No estágio atual, ao se considerar o máximo e o mínimo, dadas as distorções existentes, aparecem os fenômenos da sub-representação dos Estados mais populosos e da super-representação dos menos populosos, cujo número de habitantes nenhuma influência exerce sobre o cálculo, a não ser o de criar novas distorções, ao se incluir ou não as referidas populações, para o cálculo dos demais[12].
Devido a essa dificuldade, diante da omissão do Poder Legislativo no sentido de adequar o número de representantes conforme a população (art. 45, § 1º), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tentou estabelecer referido número por meio da Resolução nº 23.389, de 9 de abril de 2013, a qual foi objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5130-DF, impetrada pela Câmara dos Deputados. Paralelamente o Congresso Nacional editou o Decreto Legislativo nº 424/2013, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 33/2014.
O problema apontado vislumbra dificuldade intransponível na eventual fusão ou desmembramento de Estados – ressalvada a hipótese de lei casuística para solucionar a questão – restando indefinido se haveria aumento da bancada resultante de fusão ou redução da do Estado original ao desmembramento (TSE, 2014).
Um conceito importante nessa discussão é a magnitude, que significa o número de representantes a serem eleitos pelo distrito. Nos sistemas majoritários a magnitude é igual a um, geralmente (distritos uninominais)[13]. Nos demais é necessariamente maior que um, podendo variar, de baixa a média ou alta magnitude (distritos binominais, plurinominais)[14]. Quanto maior a magnitude dos distritos, maior a proporcionalidade.

quinta-feira, 8 de novembro de 2018




SUGESTÃO PARA REFORMA DA PREVIDÊNCIA
A Lei nº 13.183, de 4 de novembro de 2015 trouxe novas regras de aposentadoria por tempo de contribuição para a não incidência do fator previdenciário, que são 95 e 85 como soma da idade com tempo de contribuição, sendo esse o mínimo de 35 e 30 anos, para o homem e a mulher, respectivamente. Há uma regra de transição para o atingimento dos patamares máximos de 98 e 88, conforme o Quadro 1, abaixo:
Quadro 1 – Datas limites e fórmula 95/85
Data limite
Mulher
Homem
  Até 30 de dezembro de 2018
85
95
  De 31 de dezembro de 2018 a 30 de dezembro de 2020
86
96
  De 31 de dezembro de 2020 a 30 de dezembro de 2022
87
97
  De 31 de dezembro de 2022 a 30 de dezembro de 2024
88
98
Embora seja uma regra de transição, não é progressiva, isto é, passa-se para o patamar seguinte a cada dois anos, quando o ideal seria o prazo se elastecer com o tempo ou ficar atrelado ao aumento da expectativa de vida.
Por essa regra, a aposentadoria integral se daria aos 60 anos para homens e 55 para mulheres, com redução de cinco anos para professores no tempo de contribuição e acréscimo de cinco anos na soma.
A PEC 287/16 traz novas regras, aumentando o tempo de contribuição e estabelecendo limite de idade único, também aumentado, para a aposentadoria proporcional e para a integral.
O texto da PEC é ainda mais iníquo, na medida em que, não estabelecendo progressividade alguma, propõe regra de transição com ponto de corte único[1].
A fim de estabelecer princípios caros à técnica legística, como as regras de transição e de progressividade, propõe-se, portanto, um modelo que utiliza fórmulas, a exemplo da última legislação aprovada, o que garante um sistema de transição muito mais justo que a adoção de limites peremptórios, como o de cinquenta anos de idade para fins de incidência do pedágio, por exemplo.
Os Quadros 2 e 3, a seguir, apresentam as condições sugeridas para o modelo de ingressados e não ingressados no sistema, considerando as hipóteses de aposentadoria proporcional e integral. O Quadro 2 se refere aos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) e ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS). O Quadro 3, aos regimes dos militares e dos policiais. Tem-se como dada a ‘expectativa de vida atual’ (EVA), de 75 anos.
Quadro 2 – Modelo para RPPS e RGPS.
          SITUAÇÃO

REGIMES
DIREITO
ADQUIRIDO
INGRESSSADOS
NO SISTEMA
NÃO INGRESSADOS
NO SISTEMA
OBSERVAÇÕES
Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS)
e
Regime Geral de Previdência Social (RGPS)
Continua como está (com opção para aposentadoria proporcional)
FA: Id + TC = 90
(EVA + 15 anos)
Cálculo do benefício:
FA/2 + TC = percentual do benefício calculado sobre a média aritmética da soma das contribuições no cargo
Exemplos (contribuição ininterrupta desde os 20 anos):
A1 – Mínimo (proporcional):
55 (Id) + 35 (TC) = 90 (FAP); 90 (FAP)/2 = 45;
45 + 35 = 80 %
A2 – Máximo (integral):
65 (Id) + 45 (TC) = 110 (FAI); 110 (FAI)/2 = 55;
55 + 45 = 100 %
FA: Id + TC = 100
(EVA + 25 anos)
Cálculo do benefício:
FA/2 + TC = percentual do benefício calculado sobre a média aritmética da soma das contribuições no cargo
Exemplos (contribuição ininterrupta desde os 20 anos):
B1 – Mínimo (proporcional):
60 (Id) + 40 (TC) = 100 (FAP); 100 (FAP)/2 = 50;
50 + 40 = 90 %
B2 – Máximo (integral):
65 (Id) + 45 (TC) = 110 (FAI); 110 (FAI)/2 = 55;
55 + 45 = 100 %
Diferença de exigência de 10 anos entre os ingressados e não ingressados.

A FA é idêntica à FAP.

Não há diferença na FAI para ingressados e não ingressados.
Legenda: FA (fórmula de aquisição) [do direito à aposentadoria]; Id (idade); TC (tempo de contribuição); EVA (expectativa de vida atualizada); FAP (fórmula de aquisição proporcional); FAI (fórmula de aquisição integral).

Quadro 3 – Modelo para o regime de militares e policiais.
         SITUAÇÃO

REGIMES
DIREITO
ADQUIRIDO
INGRESSSADOS
NO SISTEMA
NÃO INGRESSADOS
NO SISTEMA
OBSERVAÇÕES
Militares
e
policiais
Continua como está (com opção para aposentadoria proporcional)
FA: Idade + TC = 75
(EVA)
Cálculo do benefício:
FA/2 + Id = percentual do benefício calculado sobre a média aritmética da soma das contribuições no cargo
Exemplos (contribuição ininterrupta desde os 20 anos):
C1 – Mínimo (proporcional):
47,5 (Id) + 27,5 (TC) = 75 (FAP);
75 (FAP)/1,4 = 37,5; 37,5 + 47,5 = 85 %
C2 – Máximo (integral):
55 (Id) + 35 (TC) = 90 (FAI); 90 (FAI)/1,4 = 45;
45 + 55 = 100 %
FA: Idade + TC = 85
(EVA + 10 anos)
Cálculo do benefício:
FA/2 + Id = percentual do benefício calculado sobre a média aritmética da soma das contribuições no cargo
Exemplos (contribuição ininterrupta desde os 20 anos):
D1 – Mínimo (proporcional):
52,5 (Id) + 32,5 (TC) = 85 (FAP);
85 (FAP)/1,4 = 42,5; 42,5 + 52,5 = 95 %
D2 – Máximo (integral):
55 (Id) + 35 (TC) = 90 (FAI); 90 (FAI)/1,4 = 45;
45 + 55 = 100 %
Diferença de exigência de 10 anos entre os ingressados e não ingressados.

A FA é idêntica à FAP.

Não há diferença na FAI para ingressados e não ingressados.

Então, a fórmula é individualizada, pois depende de dois fatores subjetivos: a idade cronológica e o tempo de contribuição de cada segurado. A utilização da idade cronológica como variável importante no cálculo visa a prover certa vantagem a quem se aposentar mais tarde, assim como se afigura uma espécie de componente assistencial, na medida em que aproveita qualquer tempo de serviço superior a um certo número de anos (cinco anos, nas simulações acima), a fim de incrementar o benefício do segurado. No caso, o cálculo da remuneração seria pela média das remunerações que ensejaram as contribuições ou seu equivalente no caso de contribuinte individual, enquanto os benefícios meramente assistenciais são coincidentes com o salário mínimo. Mesmo na hipótese de tempo de contribuição mínima (cinco anos) poderia ser aplicado o cálculo de média das remunerações. Dessa forma, os percentuais abaixo de 100% só valeriam para proventos superiores ao valor do salário mínimo.
O cálculo considerando qualquer tempo de contribuição e a idade estimula quem começou a trabalhar mais tarde no mercado formal a adiar a aposentadoria, requisito para a redução do déficit atual, nos termos da proposta do governo. Além disso, promove a inserção dos mais velhos no mercado de trabalho formal, visando a obter um provento de aposentadoria ligeiramente melhor. Está em consonância, ainda, com o envelhecimento da população nas próximas décadas e a inevitável redução da empregabilidade desse segmento etário.
Outra vantagem de se considerar o fator idade, na sugestão, é que muitos idosos sem amparo do Estado teriam algum recurso financeiro para se manter, a exemplo dos milhares de mendigos e moradores de rua, idosos. Se já recebem algum benefício como o benefício de prestação continuada (BPC) e mendigam para aumentar a ‘renda’ familiar, não haverá impacto para o erário; se não recebem, seria uma forma de resgatar essa dívida social com os mais despossuídos. Seria razoável, também, que não houvesse aumento da idade para tais benefícios.
Algo a ser definido é se algum benefício poderia ter valor inferior ao do salário mínimo. A esse respeito, lembre-se que os condenados que trabalham recebem apenas três quartos do salário mínimo, o que configura precedente a ser considerado, o qual, contudo, se aplica a pessoas cujos direitos não se equiparam aos dos cidadãos livres.
As simulações dos Quadros 4 e 5, a seguir, foram realizadas segundo o modelo proposto, para os beneficiários do RGPS e RPPS, ingressados e não ingressados no sistema.
Quadro 4 - Simulação para RGPS e RPPS – ingressados no sistema.
A1 – MÍNIMO (PROPORCIONAL)
A2 – MÁXIMO (INTEGRAL)
Idade
TC[2]
FAP
Cálculo
%
Idade
TC
FAI
Cálculo
%
53
37 (16)
90
90/2+37
82
62
46
108
108/2+46
100
55
35 (20)
90
90/2+35
80
65
45
110
110/2+45
100
60
30 (30)
90
90/2+30
75
72,5
42,5
115
115/2+42,5
100
65
25 (40)
90
90/2+25
70
80      (75)
40    (35)
120 (110)
120/2+40
100 (90)
70
20 (50)
90
90/2+20
65
87,5   (75)
37,5 (25)
125 (100)
125/2+37,5
100 (75)
75
15 (60)
90
90/2+15
60
95      (75)
35    (15)
130 (90)
130/2+35
100 (60)
80
10 (70)
90
90/2+10
55
102,5 (75)
32,5 (5)
135 (80)
135/2+32,5
100 (45)
85
5   (80)
90
90/2+5
50
110    (75)
30    (?)
140 (?)
140/2+30
100 (?)
A idade limite acima considerada (75, sublinhado) coincide com a idade limite para permanência no serviço público. Percebe-se que pela fórmula proposta, o tempo de contribuição mínimo é de 15 anos (destacado na célula de cor cinza, antepenúltima linha), quando a FAP e a FAI coincidem em 60% para as aposentadorias proporcional e integral, respectivamente (considerada a idade limite, os dados constam entre parênteses, sublinhado). A hipotética idade limite para o atual RGPS (85, última linha) leva o benefício mínimo a coincidir com a metade do salário mínimo (50%, última linha, quinta coluna), conforme norma anterior que vedava benefício abaixo desse valor. A idade e o tempo de contribuição são reduzidos em relação à PEC (destacado na cor verde). Destacados na cor vermelha os percentuais abaixo de 50%. Entre parênteses, na segunda coluna, a idade de início da contribuição (base), parâmetro sobre o qual foram efetuados todos os cálculos. Destacada na cor azul a base 20, igualmente utilizada nos quadros anteriores[3]. Estas observações são válidas para as tabelas seguintes.
Quadro 5 – Simulação para RGPS e RPPS – não ingressados no sistema.
B1 – MÍNIMO (PROPORCIONAL)
B2 – MÁXIMO (INTEGRAL)
Idade
TC
FAP
Cálculo
%
Idade
TC
FAI
Cálculo
%
58
42 (16)
100
100/2+42
92
62
46
108
108/2+46
100
60
40 (20)
100
100/2+35
90
65
45
110
110/2+45
100
65
35 (30)
100
100/2+30
85
72,5
42,5
115
115/2+42,5
100
70
30 (40)
100
100/2+25
80
80       (75)
40    (35)
120 (110)
120/2+40
100 (90)
75
25 (50)
100
100/2+20
75
87,5    (75)
37,5 (25)
125 (100)
125/2+37,5
100 (75)
80
20 (60)
100
100/2+15
70
95       (75)
35    (15)
130 (90)
130/2+35
100 (60)
85
15 (70)
100
90/2+10
65
102,5  (75)
32,5 (5)
135 (80)
135/2+32,5
100 (45)
Nesse caso verifica-se que, considerada a idade limite de 75 anos para o servidor público, o tempo de contribuição mínimo passa a 25 anos (célula de cor cinza), quando há, igualmente a coincidência de FAP e FAI em 75%. A2 e B2 possuem os mesmos valores. Isso significa que tanto para os ingressados quanto para os não ingressados, os tempos de idade e contribuição são idênticos para a aposentadoria integral.
As simulações dos Quadros 6 e 7, a seguir, foram realizadas segundo o modelo proposto, para os beneficiários militares e policiais, ingressados e não ingressados no sistema.
Quadro 6 – Simulação para militares e policiais – ingressados no sistema.
C1 – MÍNIMO (PROPORCIONAL)
C2 – MÁXIMO (INTEGRAL)
Idade
TC
FAP
Cálculo
%
Idade
TC
FAI
Cálculo
%
45,5
29,5 (16)
75
75/1,4+29,5
83
52,5
36,5
89
89/1,4+36,5
100
46,5
28,5 (18)
75
75/1,4+46,5
82
53,9
35,9
89,8
89,8/1,4+35,9
100
47,5
27,5 (20)
75
75/1,4+47,5
81
55,3
35,3
90,6
90,6/1,4+35,3
100
52,5
22,5 (30)
75
75/1,4+52,5
76
62,4
32,4
94,8
94,8/1,4+32,4
100
57,5
17,5 (40)
75
75/1,4+17,5
71
69,5
29,5
99
99/1,4+29,5
100
62,5
12,5 (50)
75
75/1,4+12,5
66
76,5 (75)
26,5 (25)
103    (100)
103/1,4+26,5
100 (96,4)
67,5
7,5   (60)
75
75/1,4+15
61
83,6 (75)
23,6 (15)
107,2 (90)
107,2/1,4+23,6
100 (79,2)


Quadro 7 – Simulação para militares e policiais – não ingressados no sistema.
D1 – MÍNIMO (PROPORCIONAL)
D2 – MÁXIMO (INTEGRAL)
Idade
TC
FAP
Cálculo
%
Idade
TC
FAI
Cálculo
%
50,5
34,5  (16)
85
85/1,4+29,5
95
52,5
36,5
89
89/1,4+36,5
100
51,5
33,5 (18)
85
85/1,4+46,5
94
53,9
35,9
89,8
89,8/1,4+35,9
100
52,5
32,5 (20)
85
85/1,4+32,5
93
55,3
35,3
90,6
90,6/1,4+35,3
100
57,5
27,5 (30)
85
85/1,4+52,5
88
62,4
32,4
94,8
94,8/1,4+32,4
100
62,5
22,5 (40)
85
85/1,4+17,5
83
69,5
29,5
99
99/1,4+29,5
100
67,5
17,5 (50)
85
85/1,4+12,5
78
76,5 (75)
26,5 (25)
103    (100)
103/1,4+26,5
100 (96,4)
72,5
12,5 (60)
85
85/1,4+15
73
83,6 (75)
23,6 (15)
107,2 (90)
107,2/1,4+23,6
100 (79,2)


As situações C2 e D2 possuem os mesmos valores. Isso significa que tanto para os ingressados quanto para os não ingressados, os tempos de idade e de contribuição são idênticos para a aposentadoria integral.
Quanto à idade de ingresso, se é mais baixa para os militares em geral, pode ser bem dilatada para policiais civis e federais, por exemplo. Destacadas, na cor verde, as idades e tempo de contribuição máximo para obtenção da aposentadoria integral são menores que para os atuais RGPS e RPPS. Foi incluída a base 18, idade mínima legal para o início nas carreiras policiais.
Como a sugestão se trata de um simples modelo exemplificativo, as variáveis podem ser alteradas, conforme a eventual tendência a prestigiar ou não a proposta do Poder Executivo. No modelo, a idade mínima para a aposentadoria proporcional foi bastante reduzida, assim como foi aumentado o percentual da remuneração em relação à proposta do governo, estando, portanto, a meio termo daquela 
Já para a aposentadoria integral o mesmo critério é adotado, idade mais tempo de contribuição, sendo igualmente individual o cálculo para cada segurado, desde que perfaça a Fórmula de Aquisição Integral (FAI).
Foram adotados dois segmentos diferenciados: 1) servidores públicos em geral e trabalhadores da iniciativa privada; 2) militares e policiais. O objetivo é preservar em parte os regimes ora em vigor para as categorias de militares e policiais, mais benéficos que para os servidores e empregados em geral, em razão da especificidade do trabalho, ou seja, atividade de risco mais exigência de higidez para seu exercício.
Verifica-se que a Fórmula de Aquisição Proporcional (FAP) é fixa, enquanto a FAI é variável. Exige-se uma FAP de 90 e 100, para os segurados do RGPS e RPPS ingressados e não ingressados no sistema, e 15 e 25 anos a mais que a expectativa de vida atual, respectivamente. Para os militares e policiais as FAP são de 75 e 85 para os ingressados e não ingressados no sistema, e expectativa de vida atual e 10 anos a mais, respectivamente. Esses índices seriam reajustados com o aumento da expectativa de vida, ou seja, a expectativa de vida atualizada (EVA).
A adoção de uma FAP para os ingressados e de outra para os não ingressados tem o objetivo de prover, parcialmente, a expectativa de direito dos ingressados, cuja garantia é decrescente, conforme o tempo de serviço mais idade. Dessa forma, a satisfação da expectativa de direito é tanto maior quanto mais próximo de atingirem a respectiva FAP. Outro efeito dessa opção é que, embora haja o alongamento do tempo para aposentadoria para os não ingressados, a aposentadoria proporcional para estes implica percentual bem maior que para os ingressados. Isso pode ser visto como uma contrapartida vantajosa em relação aos ingressados.
Destarte, o mesmo sistema pode ser aplicado aos militares e policiais que, em tese, se aposentam (ou são transferidos para a reserva) atualmente após 30 anos de contribuição, lembrando que os militares das Forças Armadas foram deixados de fora da PEC. O modelo ora sugerido pretende incluí-los, também, ao apresentar três vantagens a esses segmentos que, somadas, tornam tal inclusão mais palatável: 1) FAP menor que a aplicável aos demais servidores; 2) em consequência, a idade e o tempo de serviço mínimos são também menores; 3) percentuais de remuneração para a FAP ligeiramente superiores aos dos demais servidores.
Assim, enquanto no RGPS/RPPS os percentuais iniciais são 80 e 90 para os ingressados e não ingressados, respectivamente, na base 20, aos militares/policiais são concedidos 81 e 93, respectivamente, na mesma base 20. Essa diferença se deve à adoção do divisor 1,4 para a fórmula dos militares/policiais, enquanto para os demais utilizou-se o divisor 2. Como a FAP é menor para os militares/policiais, com redução do tempo de serviço, se utilizado o mesmo divisor, o percentual seria muito baixo. O divisor 1,4 é o que permite maior aproximação entre os segmentos, em comparação com os divisores 1,3 ou 1,5, por exemplo.
Quanto à diferenciação de idade mínima e tempo de contribuição mínimo para as mulheres, conforme previsto nas normas constitucionais e legais até o momento, é possível mantê-la com decréscimo paulatino, ainda segundo o princípio da transição. Desse modo, a expectativa de direito das ingressadas seria parcialmente garantida, em grau tanto maior quanto mais próximo da FAP respectiva estivessem.
Entretanto, pelo modelo ora sugerido não é possível reduzir a FAP para as mulheres, o que corresponderia à redução do percentual da aposentadoria proporcional. A solução é atribuir às mulheres alguns anos a mais no cálculo final, a exemplo do que a PEC 287/16 propõe para os professores. Quanto a estes, a mesma medida poderia ser adotada, como forma de manter a valorização da categoria. Se se optar, porém, pela isonomia absoluta, que ela seja feita segundo o princípio da transição, decrescendo cronologicamente. Uma sugestão poderia ser no sentido de manter a diferença de 5 anos até um ano depois de promulgada a PEC; mais 2 anos com redução da diferença para 4; então, 3 anos com redução da diferença para 3; a seguir, 4 anos com redução da diferença para 2; e afinal, mais 5 anos com redução da diferença para 1. O período total perfaz 15 anos, ou seja, metade da carreira, em média, para o recém-ingressado.
Foram feitas as simulações abaixo para as quis se adotaram valores ‘redondos’ para a FAP. Buscando-se vários valores ideais para a FAP, foram testados de 70 a 130, com tempos de contribuição de 5 em 5 anos. Adotaram-se os valores de 20 a 70, de dez em dez, como base, termo que se utilizou para indicar a idade em que o segurado começou a contribuir, supostamente de forma ininterrupta.
Os Quadros 8 e 9, a seguir, trazem na coluna à esquerda as bases, de 20 a 70. O percentual A (% A) é o calculado pela fórmula desta sugestão para aposentadoria proporcional, enquanto o percentual B (% B) é o calculado segundo os dispositivos da PEC 287/16. Percebe-se que pela sugestão ora apresentada o percentual é mais vantajoso para os mais idosos, justamente pela consideração do fator idade no cálculo. Em consequência, é menos vantajoso para quem começou a contribuir mais cedo. Essa desvantagem diminui, contudo, conforme se aumenta a FAP, de modo que passa a ser vantajosa a partir da FAP 110.
Quadro 8 – Comparação das FAP 70, 80 e 90 conforme esta sugestão e a PEC 287/16.
Base
FAP 70
FAP 80
FAP 90
Idade
TC
% A
% B
Idade
TC
% A
% B
Idade
TC
% A
% B
20
45
25
60
76
50
30
70
81
55
35
80
86
30
50
20
55
56,8
55
25
65
76
60
30
75
81
40
55
15
50
39,6
60
20
60
56,8
65
25
70
76
50
60
10
45
24,4
65
15
55
39,6
70
20
65
56,8
60
65
5
40
11,2
70
10
50
24,4
75
15
60
39,6
70
70
?
35
?
75
5
45
11,2
80[4]
10
55
24,4

Ao se comparar uma idade mínima de 65 para aposentadoria – nos termos da PEC 287/16 – com a base 20 (45 anos de contribuição, nesse caso), o percentual A (% A) seria de 100% (65+45=110; 110:2=55; 55+45=100), enquanto o percentual B (% B) seria de 96% (51+45=96). Verifica-se que quanto mais se aumenta a FAP, maior é a idade exigida para a aposentadoria proporcional e, por conseguinte, da integral.
Quadro 9 – Comparação das FAP 100, 110, 120 e 130 conforme esta sugestão e a PEC 287/16.

Base
FAP 100
FAP 110
FAP 120
FAP 130
Idade
TC
% A
% B
Idade
TC
% A
% B
Idade
TC
% A
% B
Idade
TC
% A
% B
20
60
40
90
91
65
45
100
96
70
50
110
101
75
55
120
106
30
65
35
85
86
70
40
95
91
75
45
105
96
80
50
115
101
40
70
30
80
81
75
35
90
86
80
40
100
91
85
45
110
96
50
75
25
75
76
80
30
85
81
85
35
95
86
90
40
105
91
60
80
20
70
56,8
85
25
80
76
90
30
90
81
95
35
100
86
70
85
15
65
39,6
90
20
75
56,8
95
25
85
76
100
30
95
81

A FAP 90 é a que demonstra a proposta governamental, 65 anos de idade para 25 de contribuição mínima (destacado nas células de cor roxa). Entretanto esses mínimos se referem à aposentadoria proporcional, não à integral. Foram destacadas nas células de cor laranja, as idades superiores a 75 anos e nas de cor amarela os tempos de atingimento da integralidade pela PEC, ou seja, praticamente 50 anos ou mais de contribuição. Observa-se que o cálculo gera uma perda nos valores acima de 100 (destacado nas células de cor cinza) para as FAP 120 e 130, pois os proventos integrais são limitados a 100%. As células destacadas na cor vermelha indicam os percentuais abaixo de 50%.
O maior número de coincidências entre idade e tempo de contribuição estão nas FAP 100 e 110 (seis células paralelas duas a duas, na cor verde), o que pressupõe maior aproximação com a proposta do governo. É, também, o que abrange maior espectro de possibilidades de combinações entre idade e tempo de contribuição.
A FAP 100 é a que apresenta a melhor aproximação de percentuais de aposentadoria proporcional entre esta sugestão e a PEC 287/16 (90 para 91, destacados nas células de cor azul). Do exposto, parece inevitável concluir que a opção que mais se aproxima da proposta do governo é a FAP 100. Percebe-se que pela FAP 110, considerando-se a base 20 nos termos da simulação supra, pela sugestão ora exposta, não há aposentadoria proporcional, pois ela se daria já no patamar de 100% (terceira linha, oitava coluna, célula destacada na cor roxa).
A seguir, no Quadro 10, elaboramos comparação entre a idade e o tempo de serviço mínimo para aposentadoria proporcional da sugestão ora apresentada e da PEC 287/16:
Quadro 10 - Idade e tempo de serviço mínimo para a aposentadoria proporcional.
FAP (Base 20)
Idade
TC
% A
% B
70
45
25
60
76
80
50
30
70
81
90
55
35
80
86
100
60
40
90
91
110
65
45
100
96
120
70
50
110
101
130
75
55
120
106

Para a aposentadoria integral, há diferenças de acordo com a base, conforme simulações apresentadas nos Quadros 11 e 12, a seguir.
Quadro 11 – Atingimento da integralidade nas bases 20, 25 e 30.
Base 20
Base 25
Base 30
Sugestão
PEC
Sugestão
PEC
Sugestão
PEC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
65
45
69
49
68,75
43,75
74
49
72,5
42,5
79
49
Diferença de 4 anos
Diferença maior que 5 anos
Diferença de maior que 6 anos

Quadro 12 – Atingimento da integralidade nas bases 35, 40 e 45.
Base 35
Base 40
Base 45
Sugestão
PEC
Sugestão
PEC
Sugestão
PEC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
Idade
TC
76,25
41,25
84
49
80
40
89
49
83,75
38,75
94
49
Diferença maior que 7 anos
Diferença de 9 anos
Diferença maior que 10 anos
Conclui-se, portanto, despretensiosamente, que a sugestão ora apresentada possui, salvo equivocada percepção, as seguintes vantagens em relação à proposta governamental:
1) preserva os princípios da transição e da progressividade;
2) reduz os limites de idade e de tempo de contribuição;
3) evita a odiosa estipulação de idade peremptória para o pedágio;
4) aumenta o valor dos proventos ao se considerar a mesma idade em relação à PEC ou reduz a idade para o atingimento da integralidade; e
5) privilegia o segmento mais idoso.
Sabemos, evidentemente, que a reforma da previdência é extremamente complexa, envolve interesses múltiplos, está sujeita a inúmeras variáveis e não se limita às considerações acerca do tempo de contribuição e idade mínima para aposentadoria. A presente sugestão, entretanto, buscou demonstrar que pelo menos esses fatores podem ser objeto de um tratamento mais equânime, atendendo aos princípios da transição e da progressividade.
Certo que cálculos atuariais complexos é que dão o tom do rigor – pautado pela urgência continuamente postergada – de cada tentativa de reforma. É possível, porém, buscar o equilíbrio dentre os interesses preponderantes, para que nenhum segmento da sociedade seja indevidamente privilegiado ou preterido em relação aos demais. Mais que uma tentativa de busca da equidade, é medida de justiça social garantir expectativas de direito, proporcionalmente às duas variáveis aqui manejadas, idade e tempo de serviço de cada trabalhador.

                        Brasília, março de 2017 (atualizado em novembro de 2018).
Claudionor Rocha
Consultor legislativo da Área XVII – Segurança Pública e Defesa Nacional

Fonte da imagem: jornalistaslivres.org



[1] Denominamos aqui ‘ponto de corte’, expressão utilizada em certames concursais, para o estabelecimento de limites entre escalas intervalares (de classe) sucessivas em que o tratamento de cada intervalo seja diferente. Dessa forma, os elementos que se situem nos limites de um intervalo se aproximam dos extremos do intervalo imediato, mas continua sujeito ao mesmo tratamento, o que ocasiona um hiato distorsivo. A distorção consiste em propiciar o mesmo tratamento e, portanto, não equitativo, a situações diferenciadas. Isso pode ser bem observado em sistemas proporcionais, como o mencionado, o que não ocorreria com sistemas progressivos, por exemplo.
[2] Entre parênteses nesta coluna a idade em que o segurado começou a contribuir (critério válido para as tabelas seguintes). Considerou-se a idade mínima legal de 16 anos.
[3] Idade média em que as pessoas começam a trabalhar.
[4] Para idades superiores a 70 anos (ou 75, a depender de lei), pelas regras atuais a aposentadoria nessa idade seria válida apenas para o RGPS, não para o RPPS.