quarta-feira, 9 de setembro de 2015

POLÍCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL


Às vezes se discute sobre a legitimidade e mesmo vocação imposta às agências policiais para intervir em situações de competência institucional de outros órgãos, encaminhando casos de saúde pública, de exclusões e abandonos, situações de risco envolvendo crianças e adolescentes, conflitos domésticos e outras situações de violência em que outros órgãos não tenham. Em inúmeros desses casos os órgãos policiais são os primeiros a serem acionados para resolver o conflito.
Embora não seja propriamente atribuição dos órgãos de segurança pública, várias dessas atividades, apelidadas no dia-a-dia de “assistência social”, acabam sendo prestadas pela polícia militar, bombeiros militares e polícia civil. Normalmente quando envolvem socorro, acionam os bombeiros. Quando envolvem conflitos, buscam a polícia militar. Conforme a proximidade ou oportunidade de contatarem, chamam a polícia civil.
Enfim, isso justifica ser a polícia considerada a ultima ratio, tanto do ponto de vista dos governantes, no sentido de controlar o crime e as massas, quanto do ponto de vista dos cidadãos, ao se sentirem abandonados pelos órgãos públicos.
Isso talvez ocorra justamente porque as polícias são “aqueles que podem” subjugar alguém que esteja fazendo algo ilícito ou reprovável, no dizer de Egon Bittner (“Aspectos do trabalho policial”, Edusp).
Consta que pelo menos um quarto dos atendimentos da PM são desse tipo. Creio que em alguns lugares o índice seja ainda mais alto.
Novamente considerando não ser atribuição específica das polícias, acredito que esse tipo de atendimento deva ser mantido, por duas razões principais: 1) geralmente a polícia é acionada quando o cidadão já tentou outras formas de composição ou resolução de conflitos, seja contatando o infrator ou reclamando junto ao órgão ou agência estatal responsável pelo serviço; 2) em certa medida esse tipo de atendimento tem muita afinidade com a moderna filosofia do policiamento comunitário, isto é, envolvimento da comunidade para se autoproteger, com a ajuda da polícia.
Disso infiro que se a polícia não comparece a um incidente para resolver um conflito, o sentimento que perpassa na população é que a polícia não cumpriu seu dever e, mais, que a comunidade está abandonada.
Noutro passo, se a polícia atuar resolvendo os pequenos conflitos que “não são de sua atribuição”, em tese, estará contribuindo para a pacificação social e aumentando a sensação de segurança, pelo reconhecimento da dignidade das pessoas, fomentando, assim, o sentimento de pertencimento à comunidade e, com isso, agregando à comunidade o próprio policial, a própria polícia.
Um exemplo comum da necessidade de atuação da polícia e da sensação de abandono dos cidadãos são os inúmeros casos de barulho fora de hora. Ora é uma festa que vara a madrugada, no ritmo “tunts, tunts” (ou, o que é pior, os ritmos de bailes fanque, que do belo funk americano dos anos 80 nada têm), ora são uns bocós que gastam o que não têm para botar um som no carro que obriga toda a vizinhança a ouvir pancadão, rap ou “sertanejo universitário”... Bem, mas tirante os gostos individuais, ninguém merece ouvir da polícia que ela tem coisa mais grave a cuidar, que o incomodado deve ir à delegacia às quatro da matina registrar ocorrência, ou, ainda, o absurdo de só ser atendido se souber o nome do proprietário. 

Não é difícil entender por que o narcotráfico dominou as favelas do Rio, simplesmente por falta da presença do Estado, desde o governo do revolucionário caudilho Brizola, que proibiu a polícia de subir os morros, a fim de preservar seus dignos eleitores cativos. Hoje, todos sabem o resultado.

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